
Adriana Lage comenta sobre as dificuldades enfrentadas pelos cadeirantes em relação às portas, destacando problemas quanto à largura, peso e tipo de abertura.
Adriana Lage.
As portas são sempre grandes inimigas dos cadeirantes. Dificilmente, encontraremos um cadeirante que nunca teve problemas com elas. Hoje vou comentar um pouquinho sobre esse assunto. O desenho universal está aí para nos ajudar. Só que muitos arquitetos, engenheiros e proprietários se esquecem disso. A ABNT estabelece as larguras mínimas das portas, mas nem sempre isso acontece na prática. Quem quiser conhecer um pouco sobre as normas de acessibilidade pode consultar a ABNT NBR 9050. Desde que fiz uma reforma transformando uma sala na minha suíte, me encantei pelo bloghttp://thaisfrota.wordpress.com.
Lá encontramos muitas coisas interessantes sobre arquitetura acessível.

Basicamente, tenho problemas em relação à largura, peso e tipo de abertura. Tenho cadeiras de rodas manual e motorizada, todas com largura de assento variando de 40 cm a 42 cm. Consigo passar com um pouco de aperto em portas com 70 cm. As portas de 80 cm são razoáveis, sendo as mais tranquilas de 90 cm para cima. Quando saio para passear, não tenho muito costume de frequentar banheiros, uma vez que geralmente não consigo passar nas portas.
Ri demais quando fui à Maragogi/AL, em 2010, e o funcionário do restaurante que era nosso ponto de apoio falou todo empolgado que tinham banheiro adaptado. Quando resolvi dar uma olhadinha no banheiro, fiquei passada da ideia – o banheiro era mesmo adaptado (assim me disse minha fiel escudeira Ana), mas, do lado de fora, existia uma cerca de madeira fixa no chão que não permitia que o cadeirante entrasse no banheiro! A distância entre uma tora de madeira e outra não permitia a passagem de uma cadeira de rodas. Era preciso fechar a cadeira de rodas! Acessibilidade zero. Por falar nisso, banheiro em viagem é sempre um capítulo a parte. Quando fui passear em Mangue Seco/BA, resolvi entrar num buggie e conhecer as belezas da região.
Tinha chovido demais nos dias anteriores e o sol não estava dando o ar de sua graça. Passeio vai, passeio vem, tínhamos saído cedinho de Aracaju, viajado de van, andando de balsa, depois de barco e, finalmente, o buggie. Já estava morrendo de vontade de fazer xixi, mas estava sem coragem de usar um banheiro que tinha visto no meio da areia próximo ao restaurante. Teria que andar bastante na areia, mas estava sem minha cadeira de rodas já que não coube no buggie. O lugar era medonho: uma casinha de madeira velha, caindo aos pedaços, com um degrau grande na entrada e os dizeres “Ele” e “Ela”. Quando não estava mais resistindo e me lembrei que a volta à Aracaju seria longa, conversei com a dona do restaurante. Ela me levou até um banheiro que me surpreendeu. O banheiro ficava próximo ao restaurante.
Também era uma casinha de madeira, com um pequeno degrau na entrada, mas com barras de apoio, assento elevado e espaço para circulação da cadeira de rodas. Achei muito legal a iniciativa. Confesso que Mangue Seco não é um dos locais mais confortáveis para cadeirantes. Mas vale a pena!
Sempre me deparo com portas estreitas em banheiros. Ainda bem que a maioria dos shoppings e alguns restaurantes, cinemas e teatros já contam com banheiros adaptados. Trabalhei cinco anos em um setor do banco que funcionava no 8º andar de um prédio com cerca de 5.000 funcionários. Só existem banheiros adaptados no 5º e 6º andar. Após algumas reclamações, reformaram o auditório, colocando elevador e banheiro adaptado. Nas vezes em que precisei usar o banheiro, tive que recorrer aos outros andares. Era estranho demais! O povo me recebia muito bem, mas me sentia uma invasora usando o banheiro dos outros.
As portas estreitas também são muito comuns em lojinhas de bairro ou à beira mar. Tento não gastar em locais não acessíveis. Mas, quando não resisto, protagonizo cenas lindas: a cadeirante do lado de fora, na calçada, tomando sol ou chuva e a vendedora do lado de dentro mostrando os produtos. Enquanto a vendedora revira a loja, eu fico do lado de fora dizendo ”esse sim… esse não me agrada… tem oncinha?”.
Outro problema enfrentado é o peso da porta. Não sei por que o povo quase nunca repara nesse detalhe. Não consigo abrir, por nada desse mundo, as portas do banco onde trabalho. Logo que comecei a trabalhar, cansei de ficar presa no banheiro/corredor. Alguém me ajudava a entrar no banheiro, mas já viram, no sufoco de agência, sempre me esqueciam para trás. Como o banheiro ficava num corredor deserto, com portas pesadas também, sempre precisava ligar no celular para a telefonista da agência arrumar alguém para me resgatar. Um dos seguranças, que sempre me resgatava em suas rondas, vivia dizendo “ah Dri, matando serviço!”. As maçanetas também não ajudam em nada. Tenho dificuldades com maçanetas de girar. Prefiro as portas com barra ou puxador onde posso encaixar minhas mãos e fazer força.
Aqui em Belo Horizonte, temos shoppings e lojas com portas de vidro maravilhosas. Puro vidro. Esteticamente, são muito bonitas, mas nada acessíveis. Para quem tem pouca força nos braços, elas são extremamente pesadas. Sem falar no perigo que elas correm com motoristas barbeiros como eu!
Um problema que tem me intrigado é a abertura que fica na porta do banheiro adaptado em um shopping chique de BH. Os banheiros adaptados ficam separados dos demais. São bem amplos e cheios de adaptações. Mas sempre fica uma abertura na lateral esquerda da porta. Já fiz o teste com minha irmã e descobri que quem está do lado de fora, consegue enxergar direitinho quem está dentro. Já mandei email para a administração do shopping, mas ainda na tive resposta.
A forma de abertura da porta também costuma causar dor de cabeça nos cadeirantes. Por exemplo, tenho quase 12 anos de trabalho no banco e nunca trabalhei em um local onde as portas fossem de correr. Isso facilita demais a independência do cadeirante. Existem artifícios para se lidar com portas que se abrem para frente/trás do cadeirante. Certa vez vi uma entrevista de uma cadeirante no Mais Você onde a mulher amarrava um lenço na maçaneta da porta. Quando precisava fechar a porta, puxava-a pelo lenço.
Particularmente, me atrapalho com portas. Tanto é que no meu quarto uso portas de correr nos armários e no banheiro. Fica muito mais tranquilo. O ideal para um cadeirante são portas de correr, com 90 cm de largura mínima. Nem sempre é possível estacionar a cadeira de rodas para se abrir/fechar uma porta que não corre. Muitas vezes o espaço é tão reduzido que a manobra fica inviabilizada.
Enfim, só quis dividir com vocês um pouquinho das dificuldades que os cadeirantes passam com as portas. Tomara que o desenho universal seja mesmo colocado em prática e que os profissionais da construção, engenheiros, arquitetos e proprietários de imóveis pensem nesses detalhes, previstos em lei, em suas reformas e construções.
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